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quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Renan volta a brandir ameaça contra Lava Jato

Josias de Souza



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Frustrado o plano da oligarquia parlamentar da Câmara de aprovar uma anistia ampla, geral e irrestrita para o crime de caixa dois, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), reativou a articulação para tentar aprovar projeto que atualiza a lei 4.898, de 1965, que pune o chamado “abuso de autoridade”.
Engavetada desde 2009, a proposta original é do deputado Raul Jungmann (PPS-PE), hoje ministro da Defesa. Disponível aqui, o texto não parece conter nenhuma ameaça à Lava Jato. Mas parlamentares próximos a Renan farejam o interesse dele em ajustar o projeto, de modo a interferir nas investigações, tolhendo os movimentos de produradores e juízes.
Partidário da tese do amigo Romero Jucá (PMDB-RR) segundo a qual é preciso “estancar a sangria” da Lava Jato, Renan investiu contra a força-tarefa de Curitiba nesta terça-feira. Disse que os responsáveis pela operação precisam “separar o joio do trigo”. Protagonista de nove inquéritos da Lava Jato, Renan é joio. Mas ele fala como se fosse trigo.
“A Lava Jato é muito importante e nada vai detê-la, mas precisa acabar com esse exibicionismo e esse processo de exposição das pessoas sem culpa formada”, disse Renan. “A nossa Constituição não convive bem com isso. É preciso fazer denúncias e investigar, mas com começo meio e fim. Que sejam denúncias consistentes e não mobilização política, porque o país perde com isso e as instituições também.”
Renan criticou o “exibicionismo” da Procuradoria da República na apresentação da denúncia contra Lula, na semana passada. Horas depois da entrevista do presidente do Senado, Sérgio Moro, juiz da Lava Jato, acatou a denúncia subscrita por 13 procuradores exibicionistas, enviando Lula para o banco dos réus.
Foi contra esse pano de fundo impregnado de críticas à investigação do maior escândalo de corrupção já descoberto no país que Renan retomou a prosa em defesa da aprovação de “projeto que garanta mecanismo para investigar a corrupção e proteja as garantias individuais e coletivas.”
“O que não pode é, a pretexto de se investigar, alguém promova exibicionismo. A sociedade apoia a Lava Jato. Não há hipótese de nenhuma influência e quem disser o contrário está mentindo. Mas a Lava Jato tem sim a responsabilidade de separar o joio do trigo. Não pode nivelar todos sob uma acusação genérica.”
O apoio da sociedade à Lava Jato não é compartilhado por Renan. Isso ficou claro no autogrampo em que Sérgio Machado, preposto do senador na presidência da Transpetro por 12 anos, captou seus diálogos com os pajés do PMDB, entre eles o seu padrinho Renan.
De resto, o doutor Sérgio Moro vem revelando uma notável capacidade de separar joio e trigo. Graças a essa habilidade, o magistrado serve-se do trabalho da Polícia Federal e da Procuradoria para promover condenações em escala industrial, num volume compatível com as dimensões do escárnio.. Moro já emitiu 106 sentenças condenatórias. Juntas, somam 1.148 anos, 11 meses e 11 dias de prisão.
Renan tem a sorte de militar na brigada de suspeitos com mandato. Dispõe de prerrogativa de foro. Só pode ser processado e julgado no Supremo Tribunal Federal. Ali, mercê da morosidade da Procuradoria-Geral da República e da inapetência do Supremo para atuar na persecução criminal, não há vestígio de condenação.
Menos espalhafatoso e mais profissional do que o correligionário Eduardo Cunha, Renan vai preservando o mandato que lhe permite legislar em causa própria. Implica por exemplo, com a ferramenta da delação premiada. Sustenta que a Lava Jato prende no atacado para colher confissões no varejo. Uma inverdade.
As estatísticas da Lava Jato revelam que a grossa maioria dos delinquentes que suaram o dedo estava livre. O ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, por exemplo, não precisou ser recolhido ao xilindró para delatar o patrono Renan e outros figurões do PMDB. Tudo na vida está sujeito a aperfeiçoamentos. Porém, em matéria de Lava Jato Renan é a pessoa menos indicada para apontar imperfeições.

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